segunda-feira, 16 de março de 2020

Explicando a Mente - Memória - Parte 3

Bom dia pessoal,
quarentena do coronavírus, mas continuamos trabalhando.

Esta matéria é a terceira e última parte do Explicando a Mente - memória.

As duas primeiras, vocês podem ler aqui:




Vamos começar esta última parte relembrando um ponto muito interessante abordado na parte 2:

Nossa memória é falha, ou seja, não nos lembrando de todos os detalhes de todas as nossas experiências. O por quê? Porque é inviável e também porque não precisamos de todos eles.

Isso leva a uma conclusão que pode ser dolorida para alguns: nossas lembranças não são inteiramente verdadeiras. Para deixar uma memória em uma forma lógica para ser apresentada, nosso cérebro preenche as lacunas (detalhes que não lembramos) com informações recentes, como memórias semânticas ou mesmo crenças.

Esse processo de reconstituição mostra que nossas memórias episódicas são extremamente flexíveis, e, para testar essa flexibilidade, alguns cientistas decidiram inventar falsos crimes e tentar "plantá-los" na mente de alguns voluntários para o estudo.

Esse artigo vocês encontram para baixar gratuitamente no google: "Constructing Rich False Memories of Commiting Crime".

Os resultados são bizarros, pois 70% dos participantes acreditaram que tinham cometido um crime totalmente inventado pelos cientistas. E ainda vai mais além, pois muitos deles contavam com detalhes memórias totalmente falsas, contando minuciosamente episódios envolvidos com o crime imaginário.

Como os cientistas conseguiram isso? Realizado entrevistas repletas de perguntas sugestivas. Ou seja, sugerindo culpa, eles geraram memórias sobre o crime nos participantes do estudo.


Isso mostra o porque nos Estados Unidos, muitas pessoas inocentes já foram condenadas através do Reconhecimento de Suspeitos. 

Mesmo memórias traumáticas, como as de um estupro, não são armazenadas nos mínimos detalhes, elas costumam focar em sensações específicas ou informações específicas, e algo como o rosto do estuprador pode ser facilmente esquecido. Este detalhe mostra a importância dos policiais não influenciarem em nada na escolha da vítima, pois uma sugestão como "desconfiamos deste" ou mostrar fotos de algum dos suspeitos, pode implantar falsas memórias na cabeça traumatizada da vítima. 

Para vocês terem ideia, depois do exame de DNA, centenas de pessoas foram soltas por serem inocentes, e mais de 70% delas tinham sido acusadas via reconhecimento de suspeitos.


Mas não são apenas as nossas memórias sobre crimes que podem ser passíveis de contaminação. Memórias sobre quem somos hoje e de onde viemos (referentes à nossa história pessoal) também podem.

No estudo denominado: "The altering of reported experiences" , cientistas entrevistaram adolescentes aos 14 anos e, décadas depois, fizeram uma nova entrevista e pediram para que relembrassem sua adolescência.

Pediram a descrição de características relacionadas à relação com os pais, as crenças sobre religião e sexo, além das atividades que gostavam. Comparando as respostas com as respostas antigas, observaram que todos os participantes tinham memórias pobres referentes à adolescência, e que, a maioria das memórias eram tão precisas quanto chutes.

Mas ai vocês podem perguntar, por que temos um sistema de memória tão falho e passível de erros, indigno de confiança?

Para responder, precisamos resgatar o caso citado na matéria passada, do americano Henry Molaison:


O que foi observado pelos cientistas após Henry Molaison ter uma porção do seu lobo temporal retirado, e confirmado posteriormente por outros pacientes com lesão na mesma região (principalmente hipocampo), é que o futuro e o passado parecem estar conectados no nosso cérebro de alguma forma.

O segundo paciente estudado soltou uma frase ótima para descrever, após a lesão, como era para ele pensar no futuro: "pensar sobre o futuro é como procurar uma cadeira em uma sala vazia".

Partindo dessas informações, a pesquisadora entrevistada no documentário resolveu fazer uma pesquisa com Tomografia computadorizada.  Pessoas eram escaneadas enquanto lembravam do passado e depois enquanto imaginavam o futuro, o resultado pode ser visto na figura abaixo:


As áreas cerebrais ativadas são praticamente as mesmas. Isso nos mostra que nosso sistema de memória não serve exclusivamente para lembrarmos do passado.

Na verdade, quando deixamos nossa mente viajando, divagando entre pensamentos, ela constantemente alterna entre lembrar e imaginar. Funcionando mais como uma Máquina do Tempo.

Ou seja, o mesmo maquinário que reúne as peças para relembrar o passado, pode pegar essas peças e junto com outras simular o futuro.

Pessoal, seguindo para conclusão, observamos agora que o que parecia um sistema falho, na verdade é provavelmente o que garantiu a sobrevivência e o sucesso da nossa espécie. É através desse mecanismo de lembrar e imaginar que conseguimos:
  • Prevenir erros futuros,
  • Prever como as coisas podem se desenrolar com determinadas atitudes presentes,
  • Prever as famosas pedras no caminho e como podemos dribá-las.
Neurocientistas acreditam, hoje, que esse mecanismo de simulação que possuímos entre nossas orelhas mistura nossas memórias do passado com nossos sonhos e objetivos sobre o futuro para formar nossa Identidade, quem somos hoje.

Espero que tenham gostado, vem muito mais por ai!

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