sábado, 14 de setembro de 2019

Epilepsia

Bom dia pessoal,
hoje vamos falar um pouco sobre Epilepsia.

Uma doença muito bem conhecida hoje, mas que por muito tempo foi associada a maus espíritos ou possessão. 


A epilepsia, de uma forma bem simples, pode ser definida como uma alteração temporária no funcionamento do cérebro, que pode produzir manifestações motoras, sensitivas, sensoriais e/ou psíquicas, e que normalmente dura entre segundos a alguns poucos minutos.

Como já discutimos no começo desta disciplina e em diversas matérias do blog, o cérebro funciona através de impulsos nervosos, que são impulsos elétricos. Isso, quando visto em um eletroencefalograma (EEG), mostra um padrão de ondas, que varia de acordo com a atividade que estamos realizando.


Observem a figura abaixo, com representações de EEGs da atividade cerebral:


Antes de continuarmos a discussão, precisamos entender uma diferença básica que confunde muita gente. Crises epilépticas não são necessariamente Epilepsia.

Toda crise é uma atividade encefálica extrema e sincrônica, ou seja, os neurônios das áreas afetadas disparam com uma sincronia e intensidade fora do normal. E essas crises podem ser parciais (quando atingem uma área específica do cérebro, normalmente em apenas um dos hemisférios) ou generalizadas (onde a crise acomete uma porção maior do cérebro, pegando os dois hemisférios.

Observem o registro de uma crise epiléptica generalizaada, notem a diferença nas ondas cerebrais, que indicam o funcionamento do cérebro:


- Epilepsia:

Quando falamos de Epilepsia, nos referimos à doença, que é caracterizada por crises espontâneas repetidas, ou seja, crônicas.

No mundo, um registro de 2015 apontou mais de 50 milhões de pessoas acometidas por essa doença, sendo que destas, entre 30-50% apresentam algum distúrbio psicológico/psiquiátrico em algum momento.

Apesar de tanta gente ser acometida e a doença já ter sido descrita a algum tempo, podemos observar na figura abaixo que 70% dos casos são idiopáticos, ou seja, não apresentam uma causa específica, não consegue-se descobrir a causa exata. A isso, os cientistas e médicos atribuem causas genéticas. Os 30% restante, são as epilepsias secundárias, pois acontecem devido a um tumor, ou algo do tipo.


Agora, observem o gráfico abaixo que mostra as idades mais acometidas pela epilepsia e suas crises, vocês vão facilmente notar que a manifestação é mais comum em crianças, nos seus primeiros anos de vida, e em pessoas idosas:


Os aspectos comportamentais de uma crise, ou seja, o que a pessoa vai sentir ou apresentar como sintomas, depende da área do cérebro que é afetada e dos neurônios envolvidos.

Na maioria das crises generalizadas a consciência é perdida.

Precisamos ter claro também que as convulsões são um dos sintomas da epilepsia, e podem ou não estar presentes. Importante ressaltar porque muita gente associa epilepsia com convulsão, e elas nem sempre caminham juntas.

Temos quatro tipos comuns de Epilepsia, que são divididos em duas categorias:

  • Parcial: excesso de atividade dos neurônios são focais, ou seja, em pontos específicos do cérebro. Os dois tipos mais descritos são conhecidos como Simples e Complexas, cuja diferença principal é a perda da consciência nas crises (o que acontece nas complexas).
  • Generalizadas: nestas, a atividade elétrica anormal é disseminada, costumando atingir os dois hemisférios cerebrais. Os dois tipos são Convulsivas e Não-Convulsivas.
Vale ressalta, que as convulsivas costumam ser subdividas de acordo com o tipo de crise convulsiva, são elas Tônicas (rigidez muscular), Clônicas (espasmos musculares constantes) ou Tônica-Clônica (altera entre os dois sintomas).

Quando analisamos mais afundo os casos infantis, percebemos que um tipo bem comum é o conhecido como Crises de Ausência. Que consistem em 30 segundos de ondas generalizadas (crises), seguida da perda da consciência.

Apesar de tudo, os sinais motores dessas crises são bem sutis, como pálpebras trêmulas ou contorção da boca. No gif abaixo, a criança altera duas coisas durante a crise: a expressão (observe a diferença de quando passa a crise, some a expressão de medo) e fechar a mão com força (apertar a mãozinha), que também deixa de acontecer quando a crise passa.



- Sintomas Psíquicos:

Os sintomas comumente relatados são:
  • Problemas de memória, em forma de lapsos de memória;
  • "Deja-vus" constantes, aquela sensação de que já vivenciamos aquela cena presente, mesmo sem nunca ter estado em um local.
  • Percepção distorcida do tamanho de objetos, coisas podem aumentar de tamanho ou diminuir (novamente dependendo do local exato atingido pela crise);
  • Alterações de humor e afeto: medo, terror, ansiedade e depressão.

Existe relato de muitos casos onde o psiquiatra ou médico que avaliou o caso observou apenas os sintomas de ansiedade e depressão, ou essas alterações de humor e afeto, aqui, houve tentativa de tratamento com antidepressivos ou antipsicóticos, porém, sem sucesso algum.

Estado crepuscular é o estado quando o paciente fica com a consciência diminuída, parecendo fora do corpo, exibindo um automatismo motor (movimentos constantes mas sem nenhum objetivo específico) e expressão facial de medo e/ou raiva.

Quando essa raiva do estado crepuscular é traduzida em agressões físicas, passa a chamar Furor Epiléptico.

Existe uma discussão profunda sobre a existência de uma personalidade epiléptica. Que seria uma gama de comportamentos comuns entre as pessoas portadoras de epilepsia. A briga aqui é a seguinte, os profissionais que acreditam nessa personalidade argumentam que muitos comportamentos e costumes são comuns a pessoas que tem crises epilépticas crônicas. Os profissionais que são contra enxergam um erro absurdo em querer generalizar sintomas ou características, visto que em cada pessoa e em cada caso da doença existem áreas cerebrais diferentes sendo atingidas pelas crises. Eu, particularmente, fico mais com o segundo ponto de vista.

- Tratamentos:

Por muito tempo, quando as crises eram vistas como possessão demoníaca ou coisas do tipo, o isolamento foi a solução.

Depois, quando novas técnicas foram surgindo, por algum tempo preferiam tirar um pedaço do cérebro da pessoa (porção envolvida nas crises) para que a epilepsia acalmasse. Choques elétricos também foram utilizados, apesar de que, visto pela óptica atual, aumentar a eletricidade em neurônios que já disparam acima da média não parece a melhor escolha.

Hoje, os tratamentos são em maioria farmacológicos, e a escolha do tipo ou do classe de medicamento varia de acordo com o tipo de epilepsia a ser tratado.

Resumindo bem, os fármacos conhecidos como antiepiléticos são responsáveis por reduzir a atividade cerebral. E é de suma importância sabermos que alguns atuam apenas nos focos de crise, abrandando as atividades neuronais. Porém, por conta de deprimir uma porção ou grande parte do nosso encéfalo, esses medicamentos costumam causar sonolência e letargia.

Novamente, a escolha de um medicamento adequado para o tratamento passa por um psiquiatra de qualidade, de preferência com apoio de um psicólogo que acompanha o caso, e varia de acordo com o tipo da doença. Porém, os fármacos mais comumente utilizados são: Fenitoína, Carbamazepina, Fenobarbital, os benzodiazepínicos (outra classe, que não antiepiléptico), antidepressivos, dentre outros...

Hoje, muito se discuti sobre o uso da maconha no tratamento, visto que já é comprovado cientificamente que alguns canabinoides presentes na planta são extremamente eficazes em diminuir o número de crises em um paciente. Porém, ele não causa o efeito da maconha fumada, ou seja, ele não deixa a pessoa "chapada", pois quem faz isso é o THC, que não está presente no óleo utilizados nestes tratamentos.

Para saber mais sobre o assunto recomendo a leitura no site do Drauzio Varela e também o documentário Ilegal:



Importante consideramos também que epilepsia e crises convulsivas podem possuir gatilhos. Quem tem um vídeo-game mais recente já se deparou no início de muitos jogos com a notificação de que caso a pessoa tenha estes problemas, não deve prosseguir com o jogo, pois é perigoso. Muito aqui está relacionado às alterações de cor e brilho que os jogos apresentam, que podem disparar crises.

- Psicologia e Epilepsia:

Para introduzir o assunto neste tópico, pensem na seguinte questão:
- Como uma pessoa com epilepsia deve se sentir? Imaginem do ponto de vista de uma criança, que sem saber quando será a próxima crise, passa a temer a escola ou locais públicos. O mesmo serve para adultos que não conseguem controlar o problema. O fato das crises serem espontâneas causam uma grande ansiedade e se tornam um grande transtorno para os pacientes acometidos.

Assim, a primeira coisa que essas pessoas procuram é o isolamento, simplesmente como mecanismo de defesa.

Além disso, como citado anteriormente, muitas pessoas acometidas (entre 30-50%) acabam desenvolvendo algum transtorno psiquiátrico/psicológico, necessitando de acompanhamento constante para ajudar na melhoria da qualidade de vida.

Alguns autores citam a importância do trabalho em grupos com psicólogos. Grupos de pessoas acometidas pela doença, como fonte de conhecimento, troca de experiência e ponto importantíssimo na ressocialização destas pessoas. Coisas que melhoram absurdamente a qualidade de vida e o bem-estar delas.

Era isso pessoal,
bons estudos.


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