quarta-feira, 8 de abril de 2020

Introdução à Bioquímica Clínica

Bom dia pessoal,

Hoje (finalmente) darei início à disciplina de Bioquímica Clínica aqui no Plantando Ciência.


Para dar início à discussão, acho importante lembrarmos que a Bioquímica Clínica faz parte do conjunto de disciplinas que torna o biomédico e o farmacêutico aptos a trabalharem com Análises Clínicas. 

As Análises Clínicas são uma fonte de informações riquíssimas sobre o funcionamento dos nossos sistemas e órgãos, indispensáveis para um bom acompanhamento de nossa saúde e para auxílio no diagnóstico médico.

O primeiro passo nessa caminhada é entender que um exame clínico possui três fases:
  • Fase Pré-Analítica;
  • Fase Analítica;
  • Fase Pós-Analítica.

A Fase Pré-Analítica é a maior fonte de erro dentro da Bioquímica Clínica, chegando a representar espantosos 70% dos erros dentro de um laboratório. 

Mas quais as etapas que constituem a Fase Pré-Analítica?

Podemos resumir em quatro pontos:
  • Preparo do Paciente;
  • Preparo das Amostras;
  • Armazenamento e Transporte da Amostra (quando não coletada no próprio laboratório);
  • Processamento e Separação da amostra.

De forma geral, os pontos a serem observados na fase pré-analítica são os quatro citados acima. Dentro destes tópico, temos o que chamamos de fontes de erro para o exame, que tornam os resultados infiéis ao que está acontecendo dentro do organismo do paciente.

Parece uma coisa absurda, mas em pesquisa realizada por duas alunas minhas de TCC ficou claro que uma parcela grande dos pacientes que foram realizar coleta de sangue não tinha recebido qualquer tipo de informação sobre Jejum e outras medidas que devem ser tomadas para um melhor resultado dos exames.

Com o paciente bem informado (o que também não garante que ele irá cumprir), os outros três tópicos são de responsabilidade direta do laboratório, porque aqui entra o mecanismo de funcionamento do próprio laboratório, sua rotina, o treinamento dos seus funcionários, os protocolos que são utilizados.

Quais são, então, as fontes de erro? 
Estão resumidas na figura abaixo:


Observando a figura acima, podemos tirar uma conclusão, analisando as variáveis biológicas e as definidas como pré-analíticas. Passar informações claras e corretas para os pacientes, acerca da preparação para o exame, e fazer uma boa anamnese antes da coleta, diminuem drasticamente o nível de erros e consequentemente a necessidade de se refazer exames ou de dificultar um diagnóstico correto do médico. 

Lembrem-se  que a qualidade de um exame pode garantir ou não a sobrevivência de um paciente. Análises Clínicas exigem uma atenção e responsabilidade enormes.

Mas vamos falar de alguns fatores importantes que podem influenciar no nossos resultados em Bioquímica Clínica. Os fatores pré-analíticos que mais influenciam, normalmente, são: gênero, idade, atividade física, jejum, postura, uso de drogas para fins terapêuticos ou não, consumo de bebidas alcoólicas.

Vamos iniciar nossa discussão pela Postura:

- Postura:

Por que a postura pode influenciar alguns dos parâmetros bioquímicos que serão analisados?

Porque algumas moléculas e substâncias são filtráveis e outras não. Assim, as substâncias filtráveis sairão dos vasos para aquele líquido que banha todas as células do nosso corpo, o líquido intersticial. 

Se a coleta for realizada antes da normalização, as substâncias que saíram dos vasos estarão com concentrações menores nos exames, enquanto as não filtráveis, como a albumina e outras proteínas, estarão com a concentração elevada.

Para exemplificar, Colesterol e Triglicerídeos podem estar até 10% superestimados nestes casos de Postura.

O que acontece a nível circulatório está representado na figura abaixo, retirada do Livro Tratado de Fisiologia Médica, do Guyton:

Tratado de Fisiologia Médica - Guyton

- Variações Circadiana:

As variações circadianas são as variações que ocorrem ao longo do dia em nosso organismo. Com a alteração do funcionamento do mesmo, é fácil prever que algumas dosagens podem ser afetadas. 

Um exemplo clássico é o hormônio cortisol, cujo pico ocorre logo após o amanhecer, pois ele está relacionado ao despertar, conforme mostra a figura abaixo, que mostra a variação nos níveis de cortisol e de Melatonina:


Mas e a na Bioquímica, quais dosagens podem ser afetadas pelas variações ao longo do dia? Essa resposta vocês podem observar no meu slide abaixo, que transformei em figura para deixar mais claro.

Lembrem-se que, tradicionalmente, a não ser em casos de urgência e emergência, o sangue é coletado nas primeiras horas da manhã.


- Gênero:

Além das diferenças hormonais conhecidas entre homens e mulheres, algumas variáveis bioquímicas também sofrem alterações de acordo com o sexo. No exemplo abaixo é só olhar o Valor de Referência que notamos a diferença entre homens e mulheres. 

Muitos parâmetros vem com essa diferença. Lembrem-se que isso é uma diferença biológica.

- Atividade Física

Principalmente exercícios extenuantes, possui efeito transitório sobre alguns componentes sanguíneos, principalmente pela mobilização de água e pelo fato de aumentar o metabolismo (o que diminuiria, por exemplo, a glicemia).

Por isso, pede-se para que no dia anterior, ou ainda melhor, nas últimas 36 horas, o paciente não pratique atividade física. Uma enzima que aumenta bastante, devido à sua presença na composição dos músculos estriados esqueléticos, é a enzima hepática AST (aspartato aminotransferase), muito utilizada para medir a função hepática. 

Um exercício físico intenso gera o rompimento de fibras musculares, e AST muscular cai na circulação sanguínea. Esse aumento dura entre 12 e 24 horas. Se o biomédico e o médico não souberem do exercício físico, podem acreditar, erroneamente, que existe um problema hepático devido aos altos níveis de AST (importante ressaltar que, em nenhuma hipótese, pode se fechar um diagnóstico em cima exclusivamente da dosagem de AST).

- Jejum:

O mais falado e o que mais incomoda muita gente, principalmente nós que adoramos comer. 

Mas fora a brincadeira, o jejum é indispensável, e nem mesmo o cafézinho está liberado, visto que a cafeína pode influenciar em algumas dosagens também, como a de cálcio. Apenas água está liberada, e, se pensarmos, a hidratação é de grande importância pois uma maior volume de água nos vasos permite uma punção mais fácil das veias.

Muitos parâmetros podem ser afetados aqui: glicose, insulina, perfil lipídico (triglicerídeos por exemplo), dentre outros parâmetros...

- Consumo de álcool e tabaco:

As duas figuras abaixo representam as alterações mais comuns nos parâmetros bioquímicos relacionadas ao consumo de álcool e tabaco nas últimas 48-72 horas que precederam o exame:



- Idade:

Muitos parâmetros possuem concentrações ou atividades distintas conforme a idade do paciente. O que influencia nisso é a maturidade funcional dos órgãos, o metabolismo do indivíduo...

Os valores de referência devem conter essas informações para os parâmetros relevantes, como o exemplo do triglicerídeo abaixo:


- Uso de medicamentos:

O uso de medicamentos deve ser informado durante a Anamnese, pois muitos estudados já existem e confirmar a influência de medicamentos em diversos parâmetros bioquímicos.

A tabela abaixo mostra bem essa relação, mas existem muitos outros:


Pessoal, para concluirmos essa primeira aula de Bioquímica Clínica, onde focamos mais nos fatores que antecedem o exame clínico (Pré-Analíticos), deixou um slide para reflexão:

Espero que tenham gostado do material.
As próximas aulas saem nos próximos dias.

Bons estudos.

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